Para certos setores da economia global, o impacto da pandemia da COVID-19 foi imediato e devastador. Os executivos não tiveram outra escolha a não ser abandonar crenças arraigadas e encontrar rapidamente um novo caminho. A vantagem: medidas que inicialmente pareciam ser ajustes de curto prazo para estabilizar a organização agora oferecem lições sobre como ter sucesso no novo normal.
Os Centros de Capacitação Globais (CCGs) são um caso em questão. Essas grandes instalações concentram funcionários e infraestrutura que gerenciam as operações (funções de apoio, funções corporativas de suporte ao negócio e centrais de atendimento) e suporte de TI (desenvolvimento e manutenção de aplicações, infraestrutura remota de TI e helpdesks) para sustentar o crescimento da produtividade. Algumas grandes empresas usam CCGs como um centro de excelência para automação, inovação e analytics, entre outras tarefas.
O modelo pré-crise baseado em um local compartilhado para CCGs havia sido aprimorado por décadas, mas no período de poucas semanas a pandemia o tornou obsoleto. Instalações físicas de CCGs foram fechadas e as organizações passaram rapidamente para o trabalho remoto. De forma surpreendente, os CCGs conseguiram manter os níveis de serviço enquanto se adaptavam.
A ruptura causada pela pandemia inegavelmente mudou a forma como os executivos abordam duas operações. Alguns executivos dizem que suas organizações passaram por cinco ou até dez anos de mudança no intervalo de poucos meses. CCGs com melhores práticas trabalharam com rapidez e tiveram boa performance em medidas como resiliência, continuidade e eficiência (leia a coluna “Sobre a pesquisa”). Mas nem todos os CCGs tiveram o mesmo sucesso. Alguns tiveram dificuldade com a queda dos níveis de serviço e a baixa satisfação dos funcionários. Os executivos agora têm uma oportunidade inesperada de reimaginar seus CCGs.
Qual foi a performance dos CCGs durante a crise
A análise de nossa pesquisa com 46 CCGs identificou indicadores-chave de performance durante o isolamento social: resiliência (definida como a capacidade e a disponibilidade da força de trabalho), continuidade (incluindo experiência do cliente e do funcionário) e eficiência (medida pela produtividade). Enquanto os CCGs tiveram boa performance na média, as organizações de referência atingiram pelo menos 100% de seu baseline pré-crise nas três métricas, definindo o padrão ouro para operações e prestação de serviços (Quadro 1).
Resiliência
No início da pandemia, os CCGs precisaram fazer uma rápida transição de toda a força de trabalho para um modelo de trabalho remoto. Embora a maioria tenha conseguido fazer essa transição com sucesso – 88% dos entrevistados disseram que pelo menos 90% de seus funcionários estavam trabalhando de casa durante o isolamento social – as organizações de referência focaram não apenas em elaborar uma resposta imediata, mas também em apoiar as medidas de trabalho remoto para o futuro próximo. De fato, os CCGs de alta performance estão preparados para apoiar o trabalho remoto por mais de 270 dias, enquanto os entrevistados no quartil inferior estimaram que podem sustentar essa forma de trabalho por menos de 50 dias (Quadro 2).
Adotar uma visão de longo prazo permitiu às organizações de referência capturar os benefícios de uma maior flexibilidade da força de trabalho. Um entrevistado de uma empresa de tecnologia e engenharia afirmou: “Estamos planejando criar um plano rotativo de trabalho remoto após o isolamento, com 25 a 50% dos funcionários trabalhando de casa”. Por exemplo, esses CCGs criaram escalas de trabalho que não se encaixam no turno tradicional de 9 horas, a fim de combinar as capacidades de produção com as necessidades pessoais dos funcionários. Ao permitir que os funcionários estendam seus turnos, as empresas podem gerenciar picos de produção e dar a eles intervalos para cuidarem de suas tarefas em casa. Essa abordagem pode aumentar substancialmente a resiliência dos CCGs no longo prazo na resposta a todas as formas de ruptura.
Continuidade
Existem dois elementos-chave da continuidade:
- Experiência do cliente: responder a rupturas no ambiente de trabalho durante um pico intenso de demanda de clientes se somou a um desafio já complexo para alguns CCGs. As organizações de alta performance conseguiram gerenciar esse pico e evitar uma queda nos acordos de nível de serviço (SLAs). Por outro lado, CCGs medianos tiveram uma queda consistente de 10% na performance de seus serviços nos diferentes processos, funções de trabalho e complexidades de tarefas. Os participantes da pesquisa indicaram queda na produtividade (46%) e redução na capacidade (18%) como os principais fatores.
- Experiência do funcionário: a experiência do funcionário variou significativamente entre os CCGs, sendo que as organizações de alta performance registraram satisfação dos funcionários 50% maior que a das organizações no quartil inferior. Esse padrão é relevante. Os funcionários mais produtivos apresentaram maiores níveis de engajamento com a empresa (Quadro 3). Sem esforços orquestrados e sustentáveis para incentivar um senso de conexão e engajamento no espaço de trabalho virtual, os funcionários rapidamente podem se sentir isolados e sem a direção e a orientação que precisam para se destacar em seus papéis. Uma liderança de referência dedica 30% de seu tempo a dar coaching e monitorar as equipes em trabalho remoto. Certas atividades, como reuniões diárias e online, ajudam os funcionários a se sentirem conectados e apoiados. Por outro lado, a comunicação mais frequente da gerência apresentou um impacto menos favorável na eficiência.
Eficiência
As organizações que já haviam criado capacidades ágeis conseguiram se adaptar mais rapidamente às complexidades do trabalho remoto. Práticas lean e digitalizadas para uma entrega distribuída e melhores ferramentas e processos de colaboração para manter os funcionários motivados e engajados foram alavancas-chave de produtividade. CCGs de referência são 15% mais maduros nas práticas operacionais digitalizadas que CCGs médios.
Os entrevistados citaram uma falta de colaboração entre os membros e falhas nos processos de gestão de performance como fatores que impediram a eficiência (Quadro 4). Por exemplo, a gerência precisou dedicar tempo adicional para dar suporte e direcionamento aos funcionários conforme eles se ajustavam aos ambientes remotos. Um executivo de uma empresa farmacêutica observou que: “Nossa equipe de operações enfrentou perda de produtividade porque eram necessárias várias reuniões e colaboração durante o dia”. Esse foco em manter os funcionários engajados e cientes de suas tarefas durante um tempo indeterminado foi crucial, assim como uma perda de motivação dos funcionários e equipes foi um inibidor significativo de eficiência.
Problemas de infraestrutura também impediram a performance. De acordo com um entrevistado, “limitações de capacidade às vezes prejudicam nossa produtividade, pois temos que acessar várias aplicações e transferir grandes arquivos”.
Reimaginando o modelo operacional de Centros de Capacitação Globais
Na resposta imediata à pandemia, os CCGs focaram principalmente no bem-estar dos funcionários e em definir serviços essenciais de TI. Porém, à medida que os gestores olham para os próximos 6 meses, essas prioridades mudam de forma a estabilizar o negócio e melhorar a produtividade. Um executivo de uma empresa de serviços global destacou: “A melhoria de produtividade e a experiência dos funcionários são as nossas próximas metas. Agora estamos pensando na melhoria da ergonomia nas casas.”
Conforme as empresas começam a olhar além do isolamento social e passam a pensar na recuperação econômica, muitas das lições de sua resposta imediata podem definir sua estratégia de longo prazo para o modelo global de entrega. A necessidade de inovar e agir rapidamente trouxe uma onda de possibilidades anteriormente vistas como puramente aspiracionais. Forçados a agir com rapidez, CCGs de alta performance identificaram oportunidades em cinco áreas.
Trabalho remoto
Por décadas, estar em um mesmo local foi considerado uma exigência para que certos cargos tivessem boa performance em CCGs. A pandemia provou que essa exigência é desnecessária em um grande número de casos e levou a uma rápida reavaliação de cada elemento da organização: a gerência avaliou, quanto à viabilidade do trabalho remoto eficaz, cargos de linha de frente, intermediários e de suporte nas diferentes localidades, funções, complexidades e senioridade.
Ao determinar a combinação de capacidades da força de trabalho, os executivos precisam considerar a disponibilidade e o engajamento dos funcionários, formas de trabalhar e condições de emprego (Quadro 5). Agentes de entrega, por exemplo, podem efetivamente trabalhar de forma remota em 100% de suas tarefas, enquanto funcionários cujos papéis têm interação direta com os clientes, como gestão de patrimônio, podem realizar apenas 55% de suas tarefas remotamente.
Nossa análise indica que a mudança para uma força de trabalho remota pode reduzir a necessidade de imóveis e instalações físicas para os CCGs em 20 a 40%, criando oportunidade de liberar e realocar 5% de seus custos operacionais totais – se eles puderem ser dispensados de seus contratos atuais.
Outros fatores a serem considerados na avaliação de oportunidades criadas pelo trabalho remoto no longo prazo incluem a mudança no perfil de risco para o trabalho em casa e a necessidade de ajustar os controles de segurança adequadamente, a infraestrutura necessária para apoiar uma força de trabalho dispersa e as diferenças regulatórias entre as regiões.
Organização digitalmente otimizada
A pandemia levou os clientes a uma crescente adoção de ferramentas digitais e de autosserviço. Nossa pesquisa de sentimento dos clientes B2B mostra que os canais digitais são duas vezes mais importantes agora do que eram antes da crise. Para responder a essa demanda crescente por canais digitais e à familiaridade com eles, os CCGs precisarão melhorar sua capacidade de implementar rapidamente produtos e serviços digitais inovadores, como canais de autosserviço.
Para apoiar uma força de trabalho distribuída remotamente, os CCGs também precisarão expandir suas capacidades de TI para permitir o monitoramento digital das atividades dos funcionários e o uso de diferentes aplicações. Por exemplo, um CCG de um banco global monitorou digitalmente o uso de diferentes aplicações produtivas e não produtivas para melhorar seu processo de programação de recursos, com potencial para melhorar a utilização dos funcionários em 15 pontos percentuais.
As empresas que conseguirem adaptar suas abordagens para formar equipes e fluxos de trabalho virtuais coesos estarão mais bem posicionadas para colher os benefícios do trabalho remoto. O uso fim a fim de práticas digitais – como a alocação dinâmica de trabalho, reuniões virtuais de equipe e Intelligent Actionboard, uma solução inteligente que oferece aos supervisores maior transparência sobre o progresso da equipe e recomenda intervenções priorizadas – assim como de plataformas de colaboração e escalas de trabalho flexíveis pode não apenas maximizar engajamento, utilização e produtividade, mas também aumentar a satisfação do cliente.
Gestão virtual de talentos
Uma força de trabalho remota também oferece muitas oportunidades para maximizar a agilidade e o engajamento de talentos. Ao reduzir a necessidade de os funcionários trabalharem em um local central, as organizações que adotam o trabalho remoto e contratos em tempo parcial podem estender oportunidades de emprego a um grupo mais diversificado de talentos.
As empresas precisam considerar o desenvolvimento de capacidades em advanced analytics (por exemplo, machine learning para prever as necessidades de talentos de diferentes habilidades e intervalos ou modelos de simulação para prever futuras necessidades de competências) para atrair, reter e desenvolver essa força de trabalho mais flexível. Benefícios como horas flexíveis podem possibilitar aos CCGs atender melhor a demanda por talentos, resultando em maior utilização. Para aproveitar esses benefícios, serão necessárias abordagens dinâmicas para combinar funcionários remotos com trabalhos específicos – por exemplo, designar pessoas em picos de demanda de trabalho com base em suas habilidades. Desenvolver capacidades para gerenciar funcionários remotos (como fazer a transição de todo o treinamento para online, treinar supervisores em coaching em um ambiente remoto e contar com ferramentas para otimizar a realocação de talentos conforme necessário) será necessário. Além disso, investir na expansão de ferramentas digitais que possam monitorar a performance de uma gama de funcionários em uma força de trabalho global remota ajudará a monitorar e gerenciar a performance.
Processos e equipes remotas e ágeis
Muitas empresas passaram por um curso intensivo em práticas ágeis remotas nos primeiros dias da crise. Um desafio dos CCGs é se concentrar em investir em novas práticas ágeis distribuídas que se mostraram bem-sucedidas, como tomada de decisão distribuída, acompanhamentos regulares e sprints rápidos para atingir marcos principais claros (Quadro 6). Com ênfase em equipes pequenas, as práticas ágeis, quando promovidas adequadamente, podem estimular o engajamento das equipes online.
Instalações e infraestrutura remota de próxima geração
À medida que as organizações passarem a apoiar trabalho local e remoto, uma infraestrutura confiável e segura será necessária para melhorar a resiliência e a continuidade. As empresas líderes em CCGs já estão começando ou estendendo investimentos em infraestrutura baseada em nuvem, ferramentas colaborativas (simuladores de laboratório, compartilhamento de documentos, videoconferências e comunicações em canais específicos) e tecnologias de segurança da informação (redes privadas virtuais, virtualização de áreas de trabalho, autenticação de multifatores em escala, patching acelerado para sistemas críticos e bloqueios de tela seguros).
A pandemia deixou as empresas com poucas escolhas a não ser adaptar-se rapidamente, e muitas enfrentaram o desafio. Com o foco mudando para a recuperação, os executivos devem adotar ações orquestradas para aprender com as lições e reinventar o CGG. Os benefícios são claros: melhor performance, maior resiliência e mais agilidade.