“Não existe pior momento do que esse para ser um CIO mediano.” Essas palavras, ditas por um executivo em uma conferência recente, capturam claramente a intensa pressão à qual os CIOs estão expostos. Durante anos, os executivos têm reforçado a necessidade de os CIOs deixarem de simplesmente gerenciar TI e passarem a usar a tecnologia para criar valor para o negócio. Essa prioridade agora é uma necessidade. Novas tecnologias estão no centro das tendências – de preferências de compra dos consumidores usando dispositivos móveis à promessa do uso de inteligência artificial na tomada de decisões críticas – e reformularam o cenário competitivo, inovando os modelos de negócio. Por esta razão, as empresas precisam ser inovadoras: a tecnologia deve impulsionar o negócio.
Apesar dessa necessidade urgente, 79% das organizações que buscaram se digitalizar ainda estão nos estágios iniciais da transformação tecnológica, de acordo com uma pesquisa de estratégia de TI da McKinsey realizada em 2018. Fatores legítimos estão atrasando o progresso dessa transformação, desde a escala da mudança até a alucinante complexidade dos sistemas legados. Acreditamos, no entanto, que um dos maiores desafios dessa jornada é que muitos CIOs não aceitaram o quanto seus papéis precisam expandir além das responsabilidades de performance e custos para transformar TI em uma alavanca-chave de valor do negócio.
Os três vetores de uma transformação holística
Antes de entender as responsabilidades do novo CIO, é importante entender a natureza das transformações tecnológicas. Na maioria dos casos que observamos, as transformações tecnológicas são implementadas como um conjunto de iniciativas desarticuladas em TI. Essa desarticulação faz com que avanços promissores fiquem paralisados ou não atinjam suas metas. Aprendemos que uma transformação tecnológica deve ser holística para ajudar o negócio a entregar todo o valor. Criar uma sólida experiência do cliente, por exemplo, requer uma arquitetura de dados para monitorar e ser coerente com o comportamento do cliente. Criar plataformas modulares requer abordagens reformuladas de contratação para trazer os melhores engenheiros.
Essa realidade pede que o CIO, antes de mais nada, esteja alinhado com o escopo da transformação. Nossa experiência mostra que é útil pensar nesse alinhamento a partir de três vetores:
- Reimaginar o papel da tecnologia na organização. Esse vetor inclui definir o papel da tecnologia como parceira de negócio e inovação no desenho de uma estratégia que aplique os mais recentes avanços tecnológicos (por exemplo, produtos e modelos de negócio essencialmente tecnológicos), integrar a gestão tecnológica nos silos organizacionais e oferecer excelentes experiências aos usuários.
- Reinventar a tecnologia como produto final. É necessário mudar a forma como TI funciona por meio de: adoção de metodologia ágil; melhoria dos serviços de TI com recursos de última geração como automação integral, plataforma como serviço e nuvem; formação de pequenas equipes com engenheiros altamente qualificados; e formação de parcerias tecnológicas flexíveis.
- Tornar a base duradoura. Para acompanhar os rápidos avanços tecnológicos, as organizações devem implementar uma arquitetura flexível apoiada por plataformas modulares, possibilitar a onipresença dos dados e proteger sistemas usando cibersegurança avançada.
Cinco características de um CIO transformador
Para TI se tornar uma alavanca de valor, o CIO transformador também precisa de um novo conjunto de habilidades e capacidades que assuma uma função mais abrangente. Ao trabalhar com transformações tecnológicas com centenas de CIOs, identificamos cinco características que podem ser indicadores de sucesso.
1. Líder do negócio
Para ajudar a tecnologia a gerar valor para o negócio, o CIO transformador deve entender a estratégia do negócio. As conclusões da nossa pesquisa de estratégia de TI realizada em 2018 revelam que as empresas com as melhores áreas de TI têm uma probabilidade muito maior que as outras de ter um CIO muito envolvido na elaboração da estratégia e da agenda do negócio e que uma forte performance nas tarefas centrais de TI possibilita um progresso mais rápido nas metas digitais da empresa. CIOs que podem dar esse salto tendem a adotar as ações que descrevemos a seguir.
Conhecer o negócio de dentro para fora
O escopo de uma transformação de TI significa que os CIOs devem estar preparados para interagir com o negócio de diferentes formas. Verificamos, por exemplo, que os melhores CIOs vão além de se reunir com os diretores ou de participar de reuniões de estratégia. Eles investem tempo com líderes e gerentes de outras áreas e das unidades de negócio para entender melhor as realidades do negócio na prática e sair de sua forma de atuar para ter um entendimento matizado e detalhado dos problemas dos clientes. Os CIOs chegam a essa compreensão avaliando continuamente os relatórios de satisfação dos clientes, monitorando as ligações de atendimento regularmente e participando de fóruns de usuários para ouvir feedback direto.
Quando uma grande instituição financeira decidiu desenvolver seus produtos digitais, as equipes de negócio e tecnologia lideraram juntas os painéis de feedback e escuta dos usuários desde o início e ao longo de todo o processo de desenvolvimento. Os líderes de tecnologia e negócio priorizaram a participação nesses painéis de discussão para que pudessem orientar melhor suas equipes no desenvolvimento de produtos que atendessem melhor as necessidades dos clientes finais. Já o CIO de uma empresa de serviços de tecnologia B2B adotou a prática de ouvir seus clientes regularmente para receber feedback em primeira mão sobre produtos e experiência ao fazer negócios com a empresa. O CIO passou a usar essas perspectivas para fundamentar suas decisões sobre tecnologia.
Assumir responsabilidade pelas iniciativas que geram receita
Os CIOs podem desenvolver afinidade com o negócio assumindo responsabilidade pelas iniciativas que geram impacto – como construir um e-commerce – ou trabalhando com um líder de unidade de negócio para lançar um produto digital e mensurar o sucesso usando KPIs de impacto para o negócio, e não KPIs de tecnologia. Esses esforços permitem aos CIOs ter um entendimento aprofundado das implicações da tecnologia para o negócio, como abandono do cliente devido a longos tempos de download em um site ou outras experiências negativas de usuários.
Como parte de uma transformação digital, por exemplo, o CIO de uma grande instituição financeira se comprometeu a desenvolver produtos digitais para ajudar o negócio a ampliar sua presença em um novo mercado. Embora o CIO já entendesse como construir sistemas para apoiar produtos financeiros, ele e sua equipe tinham experiência limitada na criação de novos produtos digitais para vender diretamente aos clientes. Por isso, a equipe criou um programa baseado em ciclos rápidos de teste e aprendizado para identificar o que importava para os clientes e atender suas necessidades. Subordinar decisões tecnológicas às necessidades dos clientes foi crucial para permitir que o CIO e sua equipe desenvolvessem uma solução digital que tivesse sucesso com os clientes.
Fazer parte de conselhos
Desenvolver um conhecimento mais amplo do negócio normalmente requer que os CIOs estendam suas redes de contato para além da organização. Uma das melhores formas de fazer essa extensão é se relacionar com o conselho de outra empresa. Um terço dos conselhos das empresas que estão na Fortune 500 hoje incluem um ex-CIO ou CTO e esse número continua aumentando1.
2. Agente de mudança
Uma transformação tecnológica completa não significa mudar para nuvem ou adotar novas soluções de TI. Esse nível de transformação envolve infundir tecnologia em todas as discussões e processos sobre estratégia na organização. Conduzir uma transformação em torno dos 3 vetores mencionados anteriormente (reimaginar o papel da tecnologia na organização, reinventar a tecnologia como produto final e tornar a base duradoura) começa por uma mentalidade de CIO que reconheça a necessidade de uma transformação e se comprometa com uma jornada plurianual.
Atuar em parceria com os líderes de negócio
Ganhar suporte dos líderes de negócio da organização para uma transformação requer a criação de relacionamentos de parceria com eles, baseados em metas comuns, responsabilidade mútua e responsabilização. De acordo com uma pesquisa da McKinsey sobre tecnologia de negócio, as empresas nas quais TI desempenha um papel de parceiro nas iniciativas digitais estão mais avançadas na implementação e na concretização do impacto do negócio.
Para começar a jornada de transformação, o CIO de uma empresa de transporte e logística priorizou realizar reuniões com cada líder de negócio para entender suas metas e problemas e definir expectativas sobre como eles poderiam trabalhar juntos da melhor maneira, esclarecendo, por exemplo, o que o negócio poderia esperar de TI como consultor se comparado a TI como parceiro ou provedor de serviços. Esse trabalho de entender o que importava para cada líder construiu confiança e, a partir de cada uma dessas discussões, ficou claro que o negócio gostaria de contar com uma parceria verdadeira com a área de tecnologia e que entendeu o que essa parceria significava. O CIO se baseou no relacionamento, priorizando as iniciativas na transformação tecnológica que tratavam das necessidades de negócio e trabalhando intensamente com os líderes de negócio para impulsionar o progresso. Essa colaboração constante assegurou que os produtos e serviços desenvolvidos por TI fossem adotados.
Articular o propósito
Ganhar apoio para uma transformação requer que os stakeholders entendam que a real mudança virá apenas do trabalho nos três vetores de transformação de forma estratégica e interligada. Isso significa não apenas explicar como essa abordagem tripla é melhor para TI, mas também esclarecer como ela contribui para a melhoria do negócio e como ela pode ser implementada. Ao considerar uma mudança para nuvem, por exemplo, os executivos tendem a entendê-la primeiro como uma oportunidade de redução de custos. Mas ao ajudar os executivos a entender toda a gama de benefícios da nuvem—maior velocidade de implementação, melhor produtividade do desenvolvedor e melhor resiliência e recuperação de desastres—os CIOs podem ajudá-los a ver como a nuvem pode viabilizar novos modelos de receita e serviços ligados às prioridades do negócio.
Ter um plano integrado que aponte riscos e demandas além de TI
Grandes iniciativas de TI sempre exigiram planejamento detalhado, mas os CIOs que consideram as necessidades de negócio asseguram que os planos de transformação atendem as demandas além de TI, como campanhas de marketing ou implicações legais. Esses CIOs tratam o planejamento como um processo dinâmico e não como algo estático, o que permite que as equipes de transformação eliminem os obstáculos com mais facilidade e aloquem pessoas e gastos quando e onde precisarem. Para gerenciar esse processo mais efetivamente, os CIOs também formam um war room, uma equipe dedicada que assegura que as iniciativas de transformação entreguem valor, monitorando constantemente seu andamento e ajudando a superar as causas-raiz dos problemas.
Esta foi a abordagem utilizada na transformação tecnológica e digital de um grande varejista global. O CIO formou um war room de transformação que trabalhou em conjunto com os líderes de fora da área de TI desde o início, incluindo marketing, operações, vendas e e-commerce. Juntos, eles criaram planos de trabalho detalhados. Esse planejamento inicial detalhado revelou quais sistemas precisavam ser atualizados e quando. Essa equipe de war room monitorou efetivamente o andamento e rapidamente escalonou problemas para uma resolução acelerada. Os resultados foram claros: um salto de 5 vezes nas vendas digitais e uma entrega de projetos 4 vezes mais rápida que projetos de escopo similar desenvolvidos anteriormente.
3. Caçador de talentos
Quase metade dos participantes da pesquisa de estratégia de TI da McKinsey realizada em 2018 citaram lacunas de habilidades em equipes tradicionais como o maior obstáculo para uma transformação digital bem-sucedida. Por essa razão, os CIOs precisam se concentrar não apenas em recrutar os melhores talentos, mas também em retê-los. Nesse sentido, duas soluções se mostraram eficazes.
Reimaginar a forma de atrair as ‘estrelas da tecnologia’
As empresas podem colher benefícios tremendos da terceirização. Na indústria de óleo e gás, por exemplo, a terceirização do desenvolvimento de aplicativos cresceu 50% entre 2014 e 2018. Mas esse cenário precisa mudar, especialmente para as capacidades mais cruciais. Os CIOs que querem reinventar o papel da tecnologia precisam das estrelas da área, principalmente dos melhores engenheiros. Contratando os melhores talentos, vimos empresas reduzirem seus custos com tecnologia em 30%, mantendo ou melhorando sua produtividade2. Os CIOs precisam agir rapidamente. Em apenas 18 meses, o CIO de uma empresa de transporte e logística remodelou radicalmente seu perfil de talentos. Todos os subordinados diretos e cerca de 50% dos funcionários de tecnologia eram novos e 80% haviam mudado para diferentes funções.
O Head de tecnologia e analytics de uma grande empresa de varejo formou um war room de talentos para contratar engenheiros e cientistas de dados. Como parte desse trabalho, a equipe de war room remodelou os processos de recrutamento e integração usando diferentes fontes de talentos – como HackerRank e General Assembly – e atualizando os critérios e entrevistas de candidatos com as avaliações adequadas de habilidades técnicas e outras, como coding e colaboração. A equipe também realizou reuniões de acompanhamento semanais para verificar o funil de talentos e ajustar o processo conforme necessário.
Formar talentos internamente
Para contratar as pessoas certas não importa se você não pode mantê-las. Os melhores CIOs desenvolvem trajetórias de carreira diversas para que os melhores talentos possam avançar em suas áreas de conhecimento—por exemplo, permitir que um engenheiro de alto potencial avance continuando a codificar desenhos de software em vez de forçá-lo a gerenciar outras pessoas para ter sucesso.
Treinar novamente a força de trabalho de tecnologia existente na organização também é um elemento importante dessa plataforma. O CIO de uma grande empresa de bens de consumo fez da requalificação digital e de analytics uma das principais prioridades estratégicas da empresa, lançando um programa abrangente em conjunto com a equipe de treinamento do RH. O programa investiu em um portal online para criar experiências personalizadas de treinamento baseadas nas metas e prioridades de treinamento de um funcionário. Esse programa foi complementado por outros programas, incluindo treinamento presencial, sessões de imersão com a alta gerência e a promoção de uma rede interna de especialistas que as pessoas podiam consultar sobre tópicos específicos.
4. Cultura revolucionária
Uma estratégia de talentos eficaz requer uma cultura que apoia os talentos.
Construir uma verdadeira comunidade de engenharia
A remuneração importa, é claro, mas os melhores talentos querem estar onde são valorizados. Uma forma de criar esse tipo de ambiente é dar aos engenheiros mais autonomia, reduzindo o número de gerentes e processos burocráticos, como longos relatórios e várias rodadas de aprovação.
Criar formas de coortes de grupos com habilidades em comum pode ser uma maneira eficaz de compartilhar melhores práticas e promover um senso de comunidade. O CIO de uma empresa de software criou várias iniciativas de formação de comunidade e compartilhamento de conhecimento – hackathons, “dev days”, destaques de tecnologia, treinamentos durante o almoço – quando gerentes de produtos, desenvolvedores, engenheiros de dados e arquitetos puderam se reunir semanalmente para dividir detalhes sobre seus projetos e trazer ideias ou dificuldades para discussão. O CIO participou ativamente dos eventos.
Modelar e apoiar a verdadeira colaboração
Promover a colaboração dentro das equipes de tecnologia e entre o negócio e tecnologia é um dos pré-requisitos cruciais para uma transformação bem-sucedida. Organizações no quartil superior têm maior probabilidade de ter um modelo operacional integrado ou totalmente digital, de acordo com a pesquisa de estratégia de TI da McKinsey realizada em 2018.
Na prática, os CIOs podem permitir a colaboração se eles estiverem dispostos a abrir mão de certo controle. O CIO de uma empresa de serviços financeiros percebeu que para seu time aumentar o impacto eles precisavam estar mais próximos das equipes de negócio. Por essa razão, mesclou a equipe em equipes multidisciplinares alinhadas com produtos específicos, utilizando redes informais de guilds e chapters para oferecer orientação e supervisão leve. Os CIOs mais eficazes asseguram que esse nível de colaboração é a regra também em TI. Essa garantia é particularmente importante em cibersegurança. Ela pode reduzir radicalmente os tempos de ciclo e manter um nível de segurança eficaz desde o início do desenvolvimento, trabalhando juntamente com a equipe de cibersegurança continuamente.
5. Tradutor técnico
No passado, as transformações de TI constantemente se mostravam caras, longas e de valor pouco duradouro, o que levou algumas empresas a questionar se deveriam voltar a fazê-las. Para afastar esse questionamento e ganhar confiança, os melhores CIOs desempenham um papel ativo na educação dos líderes sobre tecnologias e suas aplicações para o negócio.
Tornar as implicações das decisões de tecnologia claras para o negócio
Muitas decisões de tecnologia não passam por uma análise criteriosa suficiente do negócio além de discussões sobre custos e estratégia geral. CIOs transformadores não se contentam com esse tipo de interação, articulando em vez disso como uma solução proposta pode resolver o problema estrutural do negócio, que alternativas existem e os prós e contras de cada uma. O CEO de uma empresa de serviços de tecnologia considerou esse nível de visão tão importante que pediu que o CIO apresentasse periodicamente ao conselho modelos de negócio liderados pela área de tecnologia.
Esse papel foi particularmente importante quando um gigante do varejo estava buscando adquirir uma empresa de analytics. O CIO e sua equipe de liderança participaram desde o início na definição das capacidades de dados e analytics necessárias para conduzir a estratégia de negócio da empresa. Eles realizaram avaliações técnicas aprofundadas, revisões de compatibilidade de sistemas e plataformas de dados e testes de capacidade de provedores. O CIO realizou um piloto em uma unidade de negócio por três meses para determinar se o provedor final conseguiria atender as demandas com sua capacitação. No final do processo, os líderes do negócio puderam tomar uma decisão fundamentada.
Essas habilidades são as ferramentas que permitem a um CIO transformar TI. Em um cenário de negócio cada vez mais voltado para tecnologia, os CIOs estão posicionados como legítimos competidores para também liderar o negócio.