Para muitas empresas, em todos os setores, a pandemia de COVID-19 criou uma súbita necessidade de dinheiro em caixa e evidenciou todo o valor que pode ser obtido com a otimização das operações de geração de caixa. Conforme descrito em artigo anterior (em inglês), uma das melhores oportunidades para gerar caixa consiste em focar o capital de giro líquido. Além de tornar a empresa mais resiliente, a boa gestão do caixa permite que ela financie o crescimento (orgânico e inorgânico), consiga pagar pelos esforços de transformação holística e melhore as taxas de retorno do capital.
Embora o valor potencial do fortalecimento do capital de giro líquido seja significativo, as mudanças sustentáveis são difíceis. O desempenho de uma empresa é resultado de milhares de decisões individuais que pessoas de todas as áreas tomam diariamente: o comprador que aceita cláusulas diferenciadas, o gerente de estoque que decide fazer um pedido maior do que o necessário para evitar desabastecimento, o gerente de contas que é pressionado pelo financeiro a coletar uma fatura em atraso mas adia a cobrança para não prejudicar um relacionamento de longa data.
Para efetivamente fortalecer o capital de giro líquido, a empresa deve orientar todos os indivíduos a incorporar as mentalidades e processos decisórios certos. Uma simples diretriz vinda de cima não dará conta do recado, pois não permite a tão necessária colaboração multifuncional nem leva em conta mentalidades e comportamentos. Além disso, essa diretriz desconsidera a complexidade granular de cada pagamento, cliente, unidade de manutenção de estoque (SKU) e fornecedor – os quais, em última instância, determinam o capital de giro líquido da empresa. Adotar uma abordagem bottom-up baseada em dados é um pré-requisito para liberar totalmente o potencial do capital de giro, definir as etapas específicas capazes de melhorar o desempenho da empresa e criar uma “cultura de caixa” focada em insights.
Três elementos de uma abordagem baseada em dados
Um passo importante para fortalecer o desempenho do capital de giro líquido é utilizar analytics de dados. Para adquirir essa capacidade, a organização precisa focar três áreas:
Configurar corretamente a infraestrutura de dados
A maioria das organizações tem um ou mais sistemas de planejamento de recursos empresariais (ERP) implantados para armazenar todos as informações referentes a pedidos, faturas, pagamentos e volumes de SKUs, entre outras. Muitas vezes, porém, inúmeros sistemas independentes foram criados em diferentes partes da empresa, visando principalmente monitorar as transações efetuadas no passado em uma parte específica de um negócio ou função. Como ponto de partida para a jornada analítica, os dados precisam ser consolidados manualmente. Essa tarefa tende a ser dolorosa: embora só precise ser realizada uma vez, é um trabalho lento e rigoroso que requer muitos funcionários e está sujeito a erro humano. Por causa das diferenças na qualidade e abrangência dos dados, as análises resultantes desse esforço tendem a estar desatualizadas e raramente retratam o quadro completo.
Empresas que levam a analytics a sério criam uma infraestrutura de dados – e uma organização em torno dela – de modo a facilitar a consolidação das informações. Uma indústria avançada com forte presença global, por exemplo, decidiu priorizar a capacidade de consolidar facilmente a infraestrutura de dados. Essa decisão, entre outras, decorreu de insights adquiridos ao longo de um exercício demorado e doloroso de consolidação manual. Por exemplo, os executivos descobriram que, com grande regularidade, a empresa oferecia condições comerciais bastantes variadas para o mesmo produto ao mesmo cliente em diferentes países. Não é fácil desmontar esses silos de dados criados ao longo do tempo, mas é fundamental que isso aconteça para que o capital de giro líquido seja gerido de maneira adequada e sustentável.
Priorizar os indicadores que importam e ter fácil acesso a eles
Possibilitar que os funcionários tenham acesso aos dados é imprescindível, mas é apenas a primeira etapa. As empresas precisam definir análises e indicadores-chave de desempenho (KPIs) claros, granulares e mensuráveis que as funções de governança (p.ex., o cash office) possam monitorar regularmente para decidir como agir. Por exemplo, uma torre de controle do estoque em tempo real poderá chamar a atenção para possíveis gargalos na cadeia de suprimentos que impediriam a organização de prestar um serviço prometido a seus clientes. Essa função poderá incluir a criação e avaliação de diferentes cenários que ajudariam a corrigir tais problemas. A identificação de KPIs mensuráveis e relevantes (p.ex., disponibilidade de estoque, pedidos pendentes e estoque no nível das SKUs) pode ajudar a organização a identificar gargalos antes que eles ocorram.
Deixar de lado os relatórios retrospectivos e adotar uma mentalidade voltada para o futuro
O verdadeiro poder dos dados vem à tona quando a organização deixa de ficar “contando coisas” e adota uma mentalidade voltada para o futuro. Dados e analytics podem ser utilizados para identificar problemas precocemente e decidir sobre ações concretas. Por exemplo, uma empresa de eletricidade não gerenciava bem seus riscos de crédito, o que resultava em atrasos nos pagamentos e inadimplência. Valendo-se de uma abundância dados disponíveis, os executivos definiram KPIs ao longo da jornada do cliente, o que lhes permitiu identificar os clientes de alto risco em cada etapa, desde a aquisição até aqueles que poderiam atrasar os pagamentos. Com essa segmentação de clientes, a empresa pode agora tomar medidas corretivas (p.ex., oferecer bônus em dinheiro ou esquemas de parcelamento) para reduzir o risco de pagamentos atrasados ou inadimplência.
Fatores-chave de sucesso
Uma abordagem baseada em dados e fatos pode ajudar a organização a atingir a excelência na gestão do capital de giro líquido. Para ter sucesso, a empresa deve focar cinco fatores:
- Transparência é importante para entender quais etapas, entidades e indivíduos podem maximizar o impacto das iniciativas digitais sobre o capital de giro líquido. Visto que uma gestão eficiente do capital de giro líquido requer métricas granulares detalhadas, é fundamental adotar uma perspectiva bottom-up baseada em dados.
- As empresas devem adotar uma perspectiva de longo prazo. A consolidação manual de dados é um esforço penoso, pouco eficiente e impreciso. Configurar a infraestrutura de dados de forma a permitir acesso fácil e consolidado em tempo real é uma etapa crítica.
- Para dar continuidade a essas mudanças, é necessário distinguir entre sinal e ruído configurando KPIs granulares e mensuráveis que possam ser monitorados de perto e induzam a ações corretivas rápidas.
- A análise cuidadosa dos dados históricos pode proporcionar insights valiosos sobre como gerenciar o capital de giro líquido mediante a resolução antecipada e preventiva de problemas emergentes.
- Dados e fatos não farão sentido sem iniciativas que promovam a colaboração multifuncional, conscientizem as pessoas da importância do caixa e mudem a mentalidade das pessoas que, em última análise, impulsionam o desempenho.
Com essas capacidades e mentalidades, a organização poderá implementar rapidamente um esforço transparente e bem coordenado para fortalecer o capital de giro líquido.