No setor automotivo, assim como em outros segmentos da economia, as forças digitais estão fazendo desaparecer as fronteiras tradicionais entre setores, levando à formação de novos ecossistemas e colocando na mesa um grande pool de lucratividade a ser capturado. Dados de veículos, obtidos em consequência da maior conectividade de carros, serão fundamentais para a geração de receita, a redução de custos e o aumento da segurança, podendo representar um pool de valor de até US$ 750 bilhões até 2030.
O valor desses dados dependerá, em parte, da adoção de padrões claros. Um entendimento comum e uma linguagem compartilhada ajudarão os participantes do ecossistema a se comunicarem entre si sobre oportunidades presentes e futuras. Além disso, também tornarão mais fácil para os consumidores comparar características e capacidades das diferentes ofertas. Hoje, tais padrões não existem em termos de experiência do consumidor em um veículo conectado – que é uma das principais bases para criação de valor por meio de dados na área de mobilidade. À medida que os sistemas de conectividade se tornam agressivamente mais complexos, entender as mudanças em curso se tornará cada vez mais problemático se não houver um framework universal. Neste artigo, propomos um framework desta natureza, baseado em nossos muitos anos de estudo sobre o assunto.
O papel dos frameworks
Para entender o papel dos padrões geralmente aceitos, basta observar os frameworks para níveis de autonomia de veículos, promovidos pela taxonomia de automação da Sociedade de Engenheiros Automotivos (Society of Automotive Engineers - SAE). A taxonomia SAE é, ao mesmo tempo, abrangente e simples. Somente um novo elemento é introduzido por vez a cada nível ascendente de capacidade de automação. Uma classificação assim tão precisa reflete uma abordagem orientada pela engenharia – sim ou não, zero ou um. Durante três anos de pesquisa em diferentes setores, diversas mesas redondas com representantes de diferentes setores do mundo todo, três mil entrevistas com consumidores e mais de 100 entrevistas com executivos de empresas, que incluem de startups a grandes organizações, bem como nossa experiência atendendo clientes com foco neste assunto, o McKinsey Center for Future Mobility busca atingir o mesmo grau de clareza para cada mudança distinta nos níveis de conectividade passíveis de serem alcançados nos próximos meses e anos. O produto desses esforços é um framework para medir a conectividade de veículos e a experiência do usuário: o framework Connected Car Customer Experience (C3X) da McKinsey (Quadro).
Enquanto a autonomia pode ser definida como o grau com que os motoristas controlam a forma de se movimentar dos automóveis (do controle total do motorista à completa não intervenção humana), a conectividade deve ser definida com base da experiência das pessoas que andam nos carros. A distinção não é acadêmica. Conectividade, em grande parte, será fundamental para o uso de dados a fim de gerar receita, otimizar os custos e melhorar a segurança. A inteligência artificial (IA) será utilizada para antecipar e responder às necessidades e aos comandos dos ocupantes dos veículos, alavancando sensores dentro dos veículos e dados sobre as preferências dos consumidores a partir de diferentes domínios digitais, incluindo mídias sociais, casas e escritórios conectados.
Quanto mais tranquila e suave for a experiência do passageiro, mais oportunidades existirão de influenciar a receita, os custos e a segurança. À medida que a tecnologia do ecossistema do carro conectado se tornar mais sofisticada, as expectativas dos consumidores também evoluirão em paralelo, gerando a necessidade de entregar experiências de maior valor para os usuários. O framework C3X facilita a quantificação de oportunidades de criação de valor associadas ao aumento da conectividade. Participantes de todo o ecossistema serão capazes de entender com maior precisão o que é necessário para levar a experiência do consumidor ao próximo nível (de forma bastante literal) e quanto valor eles serão capazes de gerar por meio de um veículo conectado nesses diferentes níveis.
Decompondo a conectividade de veículos
Com o framework C3X, a conectividade geral de hardware (nível um) significa que o veículo permite somente a monitoração básica de seu uso e a avaliação da situação técnica, enquanto a conectividade individual (nível dois) significa que o veículo pode usar o perfil pessoal do condutor para acessar serviços em plataformas digitais externas, tais como Android Auto e Apple CarPlay. A monetização de dados para esses níveis já é um elemento central de como diferentes negócios fazem dinheiro, em especial (mas não exclusivamente) os nativos digitais. Fabricantes de veículos também estão começando a monetizar a conectividade; os consumidores estão começando a demandar e pagar por atributos de conectividade básica, tais como hot spots nos veículos e checkups de manutenção alavancados por uso.
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Subindo um pouco na escala, quando a experiência do usuário muda de reativa para inteligente e preditiva graças à inteligência artificial, as oportunidades de criação de valor são substancialmente amplificadas. No nível três, o foco se expande para além do motorista e passa a incorporar todos os ocupantes, que têm à sua disposição controles personalizados, entretenimento, informação e publicidade. O nível quatro traz interação ao vivo por meio de diferentes modais (tais como voz e gestos), permitindo que condutores e passageiros tenham um “diálogo” que pareça natural com o veículo e que possibilite receber recomendações proativas sobre serviços e funções. No topo da escala, no nível cinco, o sistema se torna um “chofer virtual”— uma IA cognitiva desempenha tarefas de coordenação e comunicação altamente complexas, permitindo que antecipe necessidades e realize tarefas não planejadas e complicadas para os passageiros.
Conectividade hoje—e amanhã
Cerca de quatro de cada cinco veículos nas ruas hoje estão no nível um ou abaixo no framework C3X. Isso demonstra que há espeço significativo para melhorias. Muitos veículos do segmento premium, tais como Audi Q7, BMW 7 Series, Cadillac Escalade, Lexus LX, Mercedes-Benz GLE e Tesla Model X, para citar apenas alguns, já atendem aos critérios do nível dois, entregando uma experiência de conectividade interna nos veículos bastante atrativa para os consumidores. Atualmente, nenhum veículo comercializado atende a todas as características do nível três como oferta padrão, embora alguns modelos tenham tais atributos em versões selecionadas. No entanto, nossa pesquisa mostra que, até 2030, aproximadamente metade dos novos veículos vendidos no mundo todo podem estar no nível três ou acima.
Um padrão comum para a experiência do usuário com carros conectados ajudaria muito a tornar essa visão realidade. O framework C3X permite que participantes distintos de diferentes indústrias falem a mesma língua, tornem mais evidentes situações complexas e definam marcadores claros para o que está por vir: uma experiência inteligente, conectada e tranquila no veículo. Hoje, tanto consumidores como participantes do ecossistema podem compartilhar um entendimento comum do que isso significa exatamente.