Crescimento cinco estrelas: como utilizar as avaliações online para desenhar produtos melhores

Agora que muitos países começam a sair da pandemia de COVID-19, a demanda reprimida dos consumidores parece estar impulsionando uma recuperação forte. Entretanto, as empresas hoje operam em um mundo que mudou para sempre. Quando as lojas fecharam e as restrições impostas pelos governos forçaram os consumidores a permanecer em casa, o e-commerce, que já estava em expansão, cresceu o equivalente a dez anos no primeiro trimestre de 2020 (em inglês) nos Estados Unidos. Uma das consequências, que tende a passar despercebida em meio a toda a turbulência atual, foi a enorme onda de avaliações e resenhas online – que aumentaram 40% a 80% durante os meses mais graves da pandemia em 2020, em comparação com 2019. Embora esse tipo feedback exista há anos, o impulso do e-commerce elevou o volume de tais avaliações a novos patamares, conferindo-lhe maior peso e credibilidade.

À medida que o número de avaliações com estrelas e de resenhas continua aumentando e que mais produtos são cada vez mais esmiuçados online, cresce também o número de compradores que tendem a basear suas decisões de compra nas sugestões de outros consumidores e não em informações das empresas. Se um produto mal projetado receber dos consumidores uma única e solitária estrela e inspirar críticas contundentes de compradores decepcionados, nem mesmo a campanha de marketing mais rica e abrangente conseguirá melhorar as vendas. As alavancas de antigamente – brand equity, aumento dos gastos com publicidade, grandes promoções – simplesmente deixaram de ter a mesma relevância numa época em que os consumidores têm acesso descomplicado e quase perfeito ao feedback aparentemente infinito do boca a boca. Os produtos em si – tanto sua qualidade como a experiência que oferecem ao cliente – podem se tornar a ferramenta de marketing mais importante.

Agora que a inflação começa a aumentar, varejistas e empresas de bens de consumo talvez tenham de elevar os preços para cobrir seus custos. Ao mesmo tempo, porém, enfrentam a concorrência cada vez maior de start-ups e empresas com ofertas relativamente baratas. Por outro lado, se os consumidores avaliarem os produtos da empresa de forma menos positiva que os dos concorrentes (ou até mesmo se os colocarem em pé de igualdade), aumentos de preços não serão uma opção viável. Nesse cenário, ao formularem sua estratégia pós-pandemia, os varejistas e as empresas de bens de consumo precisam dedicar mais atenção às avaliações com estrelas e ao buzz online[footnote 1]]. Para ajudá-los nesse esforço, estudamos como a pandemia de COVID-19 aumentou o volume e a importância das avaliações dos clientes. E, em seguida, quantificamos por categoria de produto o impacto das avaliações com estrelas sobre as vendas. Nossa análise demonstra que melhorias na avaliação de um produto – mesmo melhorias aparentemente insignificantes de 0,2 estrela – podem gerar crescimento significativo em muitas categorias. Nossa análise também sugere que os insights extraídos das resenhas online são mais cruciais do que nunca. As mesmas informações que dão ao consumidor o poder de fazer escolhas melhores também dão às empresas o poder de identificarem com precisão como melhorar seus produtos.

Um mercado em transformação, com canais digitais em ascensão

Fidelidade a marcas vem diminuindo nos últimos dez a quinze anos, e a pandemia acelerou essa tendência[footnote 2]]. Mais do que nunca, os consumidores estão dispostos a experimentar novas marcas, incluindo aquelas recomendadas nos sites mais populares. Dos 75% de americanos que mudaram seu comportamento de compra desde o início da pandemia, cerca de 40% afirmaram ter mudado de marca – mais do que o dobro que em 2019.

Nesse cenário fluido, o preço do produto e o feedback online talvez sejam os principais fatores que os clientes consideram ao fazer compras. Produtos genéricos, que antes teriam dificuldades para concorrer com marcas bem conhecidas, podem agora repentinamente se tornar best-sellers se receberem avaliações positivas, especialmente se seu preço for inferior aos de empresas estabelecidas. Com bastante frequência, empresas inovadoras demonstram como um produto pode provocar a disrupção de um mercado, mesmo com investimentos de marketing relativamente pequenos. Histórias semelhantes abundam, ainda que em menor escala, em quase todos os setores.

E embora algumas resenhas sejam falsas e saiba-se que certas empresas manipulam as avaliações com estrelas, a maioria dos consumidores ainda confia nessas fontes. O grande aumento no número de resenhas online – que cresceram 87% de dezembro de 2019 a dezembro de 2020 – contribuirá para aumentar sua credibilidade (Quadro 1). Embora a taxa de crescimento dos canais digitais venha apresentando pequena desaceleração (em inglês) à medida que pandemia se amaina, permanecerá bem acima dos níveis pré-pandemia – e o volume de feedback online só intensificará. (Veja mais informações sobre esta e outras mudanças duradouras na coluna “O novo cenário do varejo e das empresas de bens de consumo”.)

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Quanto melhores as avaliações, maiores as vendas

Embora as empresas consigam facilmente reconhecer o elo entre as avaliações online com estrelas e as vendas, a maioria não chegou a examinar de perto o efeito sobre o crescimento de cada estrela adicional. Alguns estudos tentaram quantificar essa relação, mas nós queríamos entender essas informações em nível bem mais detalhado. Para tanto, primeiro analisamos as resenhas e avaliações nas 70 categorias de maior vendagem em uma grande plataforma online – centenas de milhares de SKUs ao longo de um período de dois anos.

A correlação entre avaliações com estrelas e vendas de produtos foi positiva em 55 das 70 categorias que examinamos3. Em todas as categorias, 95% das unidades vendidas tinham 3,5 ou mais estrelas. As vendas de SKUs avaliadas com três ou quatro estrelas foram três vezes maiores do que as avaliadas com uma só estrela.

Até mesmo pequenos aumentos no número de estrelas – por exemplo, de 4,2 para 4,4 – geralmente produziam melhoria significativa nas vendas. Entre as 55 categorias, a oportunidade total de crescimento – isto é, o aumento cumulativo das vendas que pode ser atribuído a melhorias nas avaliações com estrelas dos produtos – foi 37% acima da amplitude do horizonte de crescimento. Contudo, essa oportunidade variou muito de categoria para categoria, desde até 17% para cafeteiras até 168% para comida para gatos (Quadro 2). Tais diferenças podem significar muitas coisas; por exemplo, que as pessoas que compram cafeteiras talvez sejam mais leais ou simplesmente confiam menos em avaliações de consumidores.

O início do horizonte de crescimento – isto é, o número de estrelas a partir do qual as vendas começam a crescer – também diferiu conforme a categoria de produtos (Quadro 3). Em muitas delas – escrivaninhas e estações de trabalho para escritório, por exemplo – o horizonte começou em torno de 3,5 estrelas. Já o horizonte de crescimento das cadeirinhas para carros começou em torno de 4,4 estrelas, provavelmente porque poucos pais considerariam comprar um produto com avaliação pior e porque os riscos associados a uma escolha errada são maiores. Do mesmo modo, o ponto dos retornos decrescentes também variou. Os consumidores talvez estejam dispostos a pagar por um medidor de glicose mais caro porque segurança e precisão são muito importantes. Mas as consequências de comprar uma marca pior de toalhas de papel ou um par de meias errado são simplesmente muito menores.

Outra constatação: os ganhos incrementais não foram iguais em cada salto no número de avaliações. Produtos cuja avaliação média subiu para no mínimo quatro estrelas – normalmente considerada uma boa avaliação – tenderam a obter os maiores benefícios. Por exemplo, determinado produto teve crescimento incremental de apenas 4% quando suas avaliações passaram de duas para três estrelas. Mas quando as avaliações melhoraram ainda mais, de três para quatro estrelas, as vendas cresceram 24%. A melhoria nas avaliações fez aumentarem tanto o número de visualizações como a taxa de conversão.

Uma nova abordagem para gerenciar avaliações e resenhas de consumidores

Apesar das vantagens óbvias de melhorar as avaliações e resenhas online de um produto, poucas empresas têm programas dedicados a isso. Muitas delas, por exemplo, não entendem plenamente o valor de analisar os textos das resenhas e, portanto, hesitam investir maciçamente em uma área que lhes parece especulativa ou infundada. Outras têm se refreado por causa das complexidades envolvidas, ainda mais agora que a pandemia obrigou-as a se concentrarem em questões mais imediatas e urgentes.

Para as empresas que quiserem aprimorar sua estratégia para gerenciar as avaliações e resenhas de consumidores, identificamos seis etapas que poderão ajudá-las a superar obstáculos e obter um impacto significativo (Quadro 4):

  • Alocar recursos para melhorar os produtos e trabalhar mais de perto com os fornecedores. As empresas devem pensar em realocar parte de seus investimentos tradicionais em crescimento (como marketing e promoções) e investir mais diretamente em seus produtos, na esperança de obter avaliações com estrelas e resenhas online mais positivas. Em alguns casos, essa mudança pode envolver a transferência de pessoal ou a criação de novos cargos, especialmente no desenho e engenharia de produtos. Se as empresas acelerarem essas mudanças – por exemplo, dedicando mais recursos à engenharia ou utilizando ferramentas melhores para prototipagem rápida e tarefas similares – elas conseguirão acelerar também o ritmo de crescimento. Do mesmo modo, parcerias estreitas com fornecedores podem surtir o mesmo efeito.
  • Repensar como o produto é apresentado e melhorar a experiência do cliente. Às vezes, as empresas podem melhorar as avaliações por meio de mudanças relativamente simples. Talvez seja necessário apenas revisar as descrições do produto – por exemplo, designar um molho como “suave” em vez de “picante” para refletir sua verdadeira natureza – ou melhorar o manual de instruções e tornar mais fácil para os clientes usarem ou montarem o produto.
  • Gerenciar a presença digital do produto. Embora aprimorar o produto ao máximo seja crucial, as empresas também só têm a ganhar se criarem uma estratégia forte para gerenciar avaliações, resenhas e outros elementos da presença digital do produto. O primeiro passo é incentivar feedbacks dos clientes, especialmente no caso de produtos com número relativamente baixo de resenhas. As empresas fariam bem em alavancar os programas “semente” de resenhas e veículos semelhantes que os varejistas online oferecem para aumentar o número de avaliações. Segundo, elas precisam assegurar que estão aproveitando ao máximo as funcionalidades de aprimoramento das resenhas oferecidas pelos sites de varejo. Oferecer imagens e vídeos interessantes e responder às perguntas dos clientes são gestos que podem aumentar significativamente a taxa de conversão do clique à compra. Por fim, algumas empresas obtiveram sucesso realizando testes A/B para entenderem melhor como os algoritmos dos mecanismos de busca classificam os resultados das pesquisas nos sites de varejo, especialmente aqueles que têm grande volume de vendas. Obviamente, as empresas devem primeiro consultar os próprios varejistas para terem certeza de que não estão violando nenhuma de suas orientações. Outras estratégias incluem investir inicialmente mais em publicidade para aumentar o reconhecimento do produto e o número de cliques e de avaliações iniciais (caso o retorno potencial do investimento justifique esses gastos).
  • Estabelecer as bases tecnológicas para analisar as resenhas e avaliações. Nesse sentido, alguns dos instrumentos mais importantes são novos conjuntos de dados e ferramentas sofisticadas de processamento de linguagem natural capazes de extrair comentários em texto livre das resenhas postadas na internet. Em muitos casos, as empresas vão querer expandir o uso de ferramentas similares para outras fontes – mídias sociais, YouTube, sites de vídeo (primeiro convertendo voz em texto para subsequente análise por ferramentas de processamento de linguagem natural), salas de bate-papo específicas de cada setor, cadastros de devoluções, registros das chamadas de atendimento ao cliente e até mesmo ações judiciais. Graças aos recentes avanços tecnológicos, as ferramentas de processamento de linguagem natural permitem identificar sentimentos positivos, neutros e negativos nas avaliações. Essas ferramentas também já conseguem classificar os atributos do produto e identificar idiossincrasias, como o uso de jargão, gíria ou sarcasmo nas avaliações.
  • Adotar novas maneiras de trabalhar. Varejistas e empresas de bens de consumo que estejam adotando essas novas ferramentas talvez precisem dar mais ênfase à colaboração multifuncional e às metas da organização como um todo. Pois engenheiros não serão mais responsáveis apenas por reduzir custos (como costuma ser o caso) e o foco das equipes de marketing não será mais apenas promover o crescimento por meio de campanhas melhores. Em vez disso, uma equipe multifuncional se dedicará melhorar a atratividade do produto para os clientes.
  • Ampliar o impacto desse trabalho aplicando insights em toda a organização. Esse processo todo é bastante laborioso. As empresas precisam primeiro adotar uma abordagem de cima para baixo e alavancar o uso de ferramentas avançadas a fim de identificar e priorizar as melhores oportunidades de seu portfólio. Em seguida, devem adotar uma abordagem de baixo para cima baseada na criação de ondas a fim de melhorarem os produtos em diferentes categorias, geralmente focando primeiro as categorias mais críticas. Esse trabalho de baixo para cima envolve aprimorar metodicamente o desenho e a funcionalidade geral das SKUs mais importantes. As equipes devem priorizar os pontos problemáticos e buscar resolvê-los com uma combinação de análises, comentários em mídias sociais e outras fontes. Por fim, devem identificar oportunidades de melhorar as margens aplicando gradualmente princípios de design-to-value – desenho voltado para a criação de valor.

Obviamente, as resenhas e avaliações com estrelas são apenas parte do kit de ferramentas disponíveis para melhorar o produto. Essas ferramentas podem traçar um quadro das principais falhas e benefícios, mas não revelarão necessidades emergentes ou problemas potenciais no futuro. Além disso, as resenhas e avaliações podem não revelar insights mais abstratos (por exemplo, motivações comportamentais subjacentes) tanto quanto técnicas mais tradicionais como entrevistas em casa, acompanhamento do comprador [shop-along], grupos de foco e pesquisas online. As avaliações e resenhas serão um complemento importante, mas não uma panaceia.

O objetivo final: Reimaginar o desenvolvimento de produtos

Embora não possam controlar as avaliações online, as empresas podem gerenciá-las e aprender com elas. Se as equipes de produto monitorarem as avaliações com estrelas e investigarem o texto das resenhas para colher insights, poderão criar ofertas melhores que revertam a erosão do market share, aumentem a disposição de pagar ou até mesmo destravem novas categorias de produtos. Nos melhores casos, produtos aprimorados poderão ajudar as empresas a ultrapassar seus concorrentes impulsionando um crescimento orgânico muito maior.

Um fabricante, por exemplo, analisou os comentários online dos clientes para identificar os pontos problemáticos de certa luminária. Logo ficou claro que os clientes sentiam-se frustrados com a dificuldade de instalar o produto e ajustar os sensores, resultando em baixa confiabilidade. Guiados por essas constatações, as equipes de engenharia redesenharam a luminária para resolver esses problemas. Com isso, a avaliação média dos clientes subiu de 2,5 para 4,5 estrelas e as vendas cresceram mais de 10%.

O ideal é que os engenheiros foquem os insights do consumidor tão logo as primeiras resenhas e avaliações sejam postadas. Alguma característica do produto parece incitar fúria quase universal ou longas reclamações? As avaliações mais positivas tendem a enfatizar os mesmos pontos? Se os engenheiros forem capazes de entender o ponto de vista do cliente, poderão definir prioridades e efetuar correções antes mesmo de pensarem na próxima iteração do produto. O tempo economizado com os insights propiciados pelas ferramentas de processamento de linguagem natural pode ser enorme: por exemplo, é possível que os engenheiros tenham de despender apenas 15 a 30 minutos examinando as informações de uma dessas ferramentas no caso de um produto de pequeno volume, em vez de dedicarem várias horas a análises a partir do zero dos efeitos e do modo das falhas de desenho (a chamada análise DFMEA). Com esse tipo de rapidez, as empresas poderão aprimorar todo o seu portfólio muito mais depressa.


E com as mudanças radicais no comportamento do consumidor na esteira da COVID-19, as empresas que não mantiverem o ritmo acabarão marginalizadas, especialmente agora que mais concorrentes estão entrando no mundo online. Embora varejistas e empresas de bens de consumo tenham hoje múltiplas prioridades, eles não podem menosprezar como o aumento das avaliações e resenhas online mudará seus negócios – não apenas o modo como os produtos são comercializados, mas também como são desenvolvidos e redesenhados. Se tiverem sucesso em obter feedback do consumidor e coletarem insights detalhados, seus novos produtos receberão feedback ainda melhor do que o de suas ofertas vitoriosas anteriores. Esse ciclo virtuoso poderá continuar indefinidamente e as empresas poderão obter crescimento extraordinário de 5%, 10% ou 20% em um mundo onde crescimento saudável costuma ser medido em pontos-base.

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