O Brasil é dotado de um amplo leque de fontes de energia, desde o gás natural até as energias eólica e solar. Assim sendo, o país está bem-posicionado para ser um líder mundial em energia. Apesar do potencial apresentado por sua crescente capacidade, o aumento da oferta não se traduziu em contas mais baixas para consumidores e empresas. A disparidade é particularmente gritante quando se compara o Brasil com outras economias ricas em energia. Por exemplo, em 2019, as tarifas brasileiras de energia elétrica para consumidores industriais cativos estavam, em média, 65% mais altas do que os preços nos Estados Unidos e 35% mais altas do que no Canadá, que se orgulha de contar com energia hidrelétrica em proporção semelhante.
Este é o paradoxo dos mercados de energia do Brasil: se a capacidade de geração vem crescendo, por que os preços de sua energia continuam persistentemente altos? A diversificação e otimização dos sistemas de energia, a redução das perdas da rede e o investimento em eficiência energética podem ajudar a ampliar a matriz energética do Brasil e, potencialmente, reduzir os preços.
Energia: abundante, mas cara
Décadas de investimentos e políticas públicas de apoio colocaram o Brasil no topo de um conjunto de mercados globais em geração de energia (quadro). Ele conta com a maior indústria de biomassa do mundo e ocupa o segundo lugar em capacidade hidrelétrica. Os analistas do setor veem potencial adicional em energia solar, energia eólica e gás natural.
Em energia eólica, a capacidade instalada em terra no Brasil totalizava 16,5 gigawatts em maio de 20201. No entanto, os especialistas dizem que o potencial do país pode ser 30 vezes maior, chegando a 500 gigawatts. A energia solar também é promissora. Em 2019, cerca de 5 terawatts-hora de energia dos raios solares foram injetados na rede elétrica nacional2. Estudos indicam que, se o Brasil desenvolver apenas suas regiões mais ensolaradas, a produção pode chegar a 500 terawatts-hora por ano, o suficiente para atender a 90% de sua demanda de energia em 2019. Por fim, a produção de gás natural também vem apresentando um forte aumento.
Em 2019, o Brasil produziu 122 milhões de metros cúbicos por dia, um aumento de 9,4% em relação ao ano anterior3.Considerando-se suas reservas, o Brasil tem potencial para mais do que triplicar a produção de gás natural para 380 milhões de metros cúbicos até 2050.
Apesar da abundância de ativos energéticos, os brasileiros ainda pagam preços altos pela energia. Nossa análise dos mecanismos de mercado e estruturas de preços do Brasil identificou três abordagens que podem ajudar a reduzir os custos (vide coluna “Analisando desafios e oportunidades na energia brasileira”).
Diversificar e otimizar o sistema de energia
A análise da McKinsey mostra que, dada a queda constante dos custos, os parques eólicos já têm o menor custo nivelado de energia, e a energia solar superará esse nível em três a quatro anos. Contudo, ao aumentarem a participação das energias renováveis, os operadores da rede também devem investir em soluções capazes de equilibrar melhor a volatilidade da energia renovável e a ciclicidade da demanda – ou seja, quando nuvens ou períodos sem vento reduzem a produção.
Proporcionar segurança energética ao Brasil envolve as seguintes opções de estabilização:
- centrais termelétricas de pico; por exemplo, turbinas de comutação rápida, capazes de aumentar e diminuir sua produção de acordo com o fluxo de energia renovável
- integração com a rede internacional; por exemplo, enviar energia a regiões mais amplas ou retirar energia delas, o que reduz o risco de subgeração ou sobregeração
- gestão de resposta à demanda; por exemplo, dar incentivos aos clientes para que reduzam o uso de energia
- tecnologias de armazenamento, como baterias ou usinas hidrelétricas reversíveis, que podem entrar em cena em caso de disrupção da energia
Sem dúvida, não há uma solução única que sirva para tudo. O que os planejadores da rede devem fazer é avaliar as situações e planejar com clareza.
Reduzir as perdas da rede
O Brasil perde cerca de 18% da energia que gera em suas redes de transmissão e distribuição. Esse número está próximo da média regional, mas consideravelmente acima das perdas de 8% na Europa e na América do Norte. O país deve se empenhar para atingir esses benchmarks internacionais com o intuito de diminuir as tarifas dos clientes finais, sobretudo os comerciais, e de aumentar a competitividade das empresas brasileiras.
Investir em eficiência energética
As empresas que reduzem o desperdício de energia e aumentam a eficiência energética também podem beneficiar a sociedade, ajudando o país a consumir menos recursos de alto custo e com uso intensivo de carbono e, ao mesmo tempo, gerar empregos por meio de iniciativas de eficiência energética. De acordo com o índice de eficiência energética ODEX, o setor residencial do Brasil melhorou sua eficiência energética em 21% de 2005 a 2018 e o setor de transporte melhorou em 18%, enquanto, no setor industrial, o aumento foi de meros 7%. Entre as iniciativas para aumentar a eficiência energética do setor industrial estão a melhora da reciclagem, a ampliação do uso de sistemas de gestão de energia e o investimento no desenvolvimento dos profissionais para ajudá-los a identificar oportunidades de eficiência energética.
Como os preços mais baixos podem afetar a economia
Os efeitos econômicos da redução dos preços da eletricidade se propagarão por toda a economia de maneiras possivelmente inesperadas – inclusive em áreas que extrapolam os mercados de energia:
- Os setores que consomem muita energia, como mineração, produtos químicos e aço, poderiam ganhar competitividade.
- As fábricas poderiam acelerar a eletrificação de processos industriais.
- Os consumidores poderiam comprar novos aparelhos de ar condicionado e outros eletrodomésticos.
- A adoção dos carros elétricos poderia se acelerar.
Portanto, é fundamental entender e modelar as implicações desses efeitos secundários.
As empresas devem refletir sobre como a energia mais barata afetará seus planos de negócios. Além disso, o Brasil pode melhorar ainda mais sua posição internacional em energia de baixo carbono baseada na geração hidrelétrica, bastando desenvolver seus outros ativos renováveis e se preparar para uma era de sustentabilidade. A eletricidade move quase todos os aspectos de nossa vida, trabalho, saúde e bem-estar. Em qualquer situação, uma rede de baixo custo poderia tornar o Brasil mais eficiente, resiliente e competitivo no longo prazo.