Além do coronavírus: o caminho para o próximo normal

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“Para algumas organizações, a sobrevivência no curto prazo é o único item da agenda. Outras estão espiando através da cortina de incertezas, pensando como irão se posicionar uma vez que a crise tiver passado e as coisas voltarem ao normal. A questão é: como será esse ‘normal’? Embora ninguém possa dizer quanto tempo a crise durará, o que vemos do outro lado não se parecerá ao normal dos últimos anos.”

Essas palavras foram escritas há 11 anos, em meio à última crise financeira global, por Ian Davis, um de nossos managing partners. Elas ainda estão vigentes mas, quando muito, subestimam a realidade que o mundo está enfrentando atualmente.

Está cada vez mais claro que a nossa era será definida por um divisor de águas fundamental: o período anterior à COVID-19 e o novo normal que surgirá na era pós-vírus: o “próximo normal”. Nessa nova realidade sem precedentes, seremos testemunhas de uma dramática reestruturação da ordem social e econômica na qual as empresas e a sociedade funcionavam tradicionalmente. E, no futuro próximo, veremos o início de discussões e debates sobre quais serão as implicações do próximo normal e como seus contornos irão divergir exatamente daquele normal que, antes, moldava nossas vidas.

Neste artigo, buscamos responder a questão colocada por líderes nos setores público, privado e social: o que será preciso para atravessar esta crise, agora que nossas métricas e premissas tradicionais se tornaram irrelevantes? Em poucas palavras, é nossa vez de responder uma questão que muitos de nós alguma vez perguntamos aos nossos avós: o que você fez durante a guerra?

Nossa resposta é um chamado à ação ao longo de cinco estágios que irão da crise de hoje ao próximo normal que surgirá depois que a batalha contra o coronavírus for vencida: Resolução, Resiliência, Retorno, Reimaginação e Reforma.

A duração de cada estágio variará de acordo com o contexto geográfico e da indústria, e as instituições poderão encontrar-se operando em mais de um estágio simultaneamente. Hoje, um grupo de colegas publicou o artigo “Protegendo nossas vidas e nossos meios de sobrevivência: o imperativo do nosso tempo”, que enfatiza a urgência de solucionar as questões do vírus e da economia agora e, portanto, precede o foco deste artigo que visa reimaginar o futuro após a pandemia.

Em conjunto, os cinco estágios representam o imperativo do nosso tempo: a batalha contra a COVID-19, que deve ser vencida pelos líderes de hoje se quisermos encontrar um caminho social e economicamente viável rumo ao próximo normal.

Resolução

Em quase todos os países, os esforços de resposta à crise estão em pleno movimento. Uma ampla gama de intervenções de saúde pública foi implementada. Os sistemas de saúde estão explicitamente em pé de guerra para aumentar sua capacidade de leitos, suprimentos e trabalhadores preparados. Há esforços em andamento para aliviar a falta de provisões médicas de vital importância. Os planos de continuidade das empresas e segurança dos funcionários escalaram, nos quais o trabalho remoto tem sido estabelecido como a modalidade operacional padrão. Muitas estão lidando com profundas reduções no ritmo das operações, enquanto outras buscam acelerar para atender demandas em áreas críticas que incluem alimentos, produtos domésticos e artigos de papel. Instituições educacionais estão migrando para plataformas online para fornecer oportunidades de aprendizado devido à suspensão das aulas. Este é o estágio no qual os líderes estão focados atualmente. Para saber mais, veja Coronavirus: Leading through the crisis.

Ainda assim, uma combinação tóxica de inação e paralisia permanece, evitando escolhas que precisam ser feitas: implementar o lockdown ou não; isolamento ou quarentena; fechar a fábrica agora ou esperar por uma ordem superior. Esse é o motivo pelo qual chamamos este primeiro estágio de “Resolução”: a necessidade de determinar a escala, o ritmo e a profundidade das ações requeridas tanto no nível das empresas como do Estado. Nas palavras de um CEO: “Eu sei o que fazer. Só preciso entender se aqueles que devem tomar uma ação compartilham a minha resolução de fazê-lo”.

Resiliência

A pandemia se transformou em uma crise crescente para a economia e o sistema financeiro. O grave recuo da atividade econômica, necessário para proteger a saúde pública, está prejudicando o bem-estar dos cidadãos e das instituições. A rápida sucessão de desafios de solvência e liquidez que atingiu diversas indústrias está se mostrando resistente aos esforços dos governos e bancos centrais no sentido de manter o funcionamento do sistema financeiro. A crise de saúde está se transformando em uma crise financeira à medida que as incertezas quanto à magnitude, duração e proporção da queda do PIB e do nível de empregos destroem o que ainda resta de confiança empresarial.

O choque do impacto econômico resultante dos esforços de eliminação do vírus em nossos meios de sobrevivência poderia ser o maior visto em quase um século.

Uma análise do McKinsey Global Institute, baseada em diversas fontes, indica que o choque do impacto econômico resultante dos esforços de eliminação do vírus em nossos meios de sobrevivência poderia ser o maior visto em quase um século. Na Europa e Estados Unidos, é provável que isso leve a um declínio da atividade econômica – em um único trimestre – que pode ser muito maior do que a perda de renda experimentada durante a Grande Depressão.

Diante desses desafios, a resiliência é uma necessidade vital. Questões de curto prazo da gestão de caixa relacionadas à liquidez e solvência claramente são primordiais. Mas logo em seguida, as empresas precisarão fazer planos de resiliência mais abrangentes à medida que o choque começa a provocar uma reviravolta nas estruturas da indústria, redefinindo as posições competitivas para sempre. Grande parte da população experimentará incertezas e estresse nas finanças pessoais. Os líderes dos setores público, privado e social precisarão tomar difíceis decisões “durante o ciclo”, visando equilibrar a sustentabilidade social e econômica, uma vez que a coesão social já está sob forte pressão por parte do populismo e de outros desafios existentes antes do coronavírus.

Retorno

O retorno das empresas a um estado de saúde operacional após uma paralização severa é extremamente desafiador, como a China tem observado mesmo com a lenta volta ao trabalho. A maior parte das indústrias precisará reativar a sua cadeia de suprimentos inteira, inclusive porque as diferentes escalas e timing do impacto do coronavírus fazem com que as cadeias de suprimentos mundiais enfrentem disrupções em várias regiões. O ponto mais fraco da cadeia determinará o sucesso ou fracasso do retorno à contratação, capacitação e alcance dos níveis anteriores de produtividade da força de trabalho. Dessa forma, os líderes devem reavaliar todo o sistema de negócios e fazer um plano de medidas de contingência para que a empresa retorne a uma produção eficaz com ritmo e escala.

Os líderes do governo poderão enfrentar uma dolorosa “escolha de Sofia” : mitigar o ressurgimento do risco à vida versus o risco à saúde da população que poderia resultar de outro forte recuo econômico.

Para agravar o desafio, o inverno trará uma crise maior para muitos países. Sem uma vacina ou tratamento profilático eficaz, o rápido retorno a uma crescente propagação do vírus é uma ameaça real. Em tal situação, os líderes do governo poderão enfrentar uma dolorosa “escolha de Sofia”: mitigar o ressurgimento do risco à vida versus o risco à saúde da população que poderia resultar de outro forte recuo econômico. O retorno, portanto, pode requerer um esperado – porém incerto – “cessar-fogo” temporário do vírus nos meses de verão no hemisfério norte para ampliar as capacidades de teste e monitoramento, a capacidade do sistema de saúde e o desenvolvimento de uma vacina e tratamentos para lidar com um segundo surto. Para saber mais, veja Bubbles pop, downturns stop.

Reimaginação

Um choque dessa magnitude criará uma alteração descontínua nas preferências e expectativas dos indivíduos como cidadãos, funcionários e consumidores. Tais alterações e seu impacto em como vivemos, trabalhamos e usamos a tecnologia surgirão com mais clareza nas próximas semanas e meses. As instituições que se reinventarem para extrair o máximo proveito das melhores visões e previsões, à medida que as preferências mudam, alcançarão sucesso desproporcional. Claramente, o mundo online do comércio sem contato poderia ser impulsionado de maneiras que mudariam o comportamento do consumidor para sempre. Mas outros efeitos podem se mostrar ainda mais significativos já que a busca por eficiência dá lugar à necessidade de resiliência – o fim da globalização da cadeia de suprimentos, por exemplo, caso a produção e o sourcing se aproximarem do usuário final.

A crise revelará não apenas vulnerabilidades, mas oportunidades para melhorar a performance das empresas. Os líderes deverão reconsiderar quais custos são realmente fixos e quais são variáveis, pois o fechamento de enormes áreas de produção revelará o que é absolutamente indispensável e o que é prescindível. As decisões quanto ao grau de flexibilização das operações, sem perda de eficiência, provavelmente serão baseadas na experiência com o fechamento de grande parte da produção global. A oportunidade para aumentar a adoção da tecnologia será acelerada com a rápida aprendizagem sobre o que é necessário para alavancar a produtividade quando a mão de obra não está disponível. O resultado? Uma sólida percepção daquilo que torna as empresas mais resilientes a choques, mais produtivas e mais capazes de entregar aos clientes.

Reforma

O mundo agora tem uma definição muito mais precisa do que significa um “evento cisne negro”. Esse choque provavelmente dará lugar a um desejo de limitar alguns fatores que tornaram o coronavírus um desafio global, e não um mero problema a ser gerenciado localmente. É provável que os governos se sentirão mais encorajados e apoiados pelos cidadãos a assumir um papel mais ativo na reconfiguração da atividade econômica. Os líderes empresariais precisam antecipar mudanças em políticas e regulações que tenham o apoio da população, uma vez que a sociedade buscará evitar, mitigar e prevenir uma futura crise de saúde semelhante à que estamos vivenciando atualmente.

Na maioria das economias, sistemas de saúde que pouco mudaram desde a sua criação após a Segunda Guerra Mundial precisarão definir como irão atender um volume de pacientes alto e repentino, administrando-os continuamente com atendimentos presenciais e virtuais. Em um mundo interconectado e altamente móvel, as abordagens de saúde pública devem repensar a velocidade e a coordenação global necessárias para reagir. Temas como políticas de infraestrutura crítica de saúde, reservas estratégicas de suprimentos básicos e instalações de produção contingente de equipamentos médicos precisarão ser abordados. Gestores do sistema financeiro e da economia, tendo aprendido com as lições das falhas induzidas pela economia durante a última crise financeira global, agora devem revidar com o fortalecimento do sistema para suportar graves choques exógenos e globais, tais como o impacto dessa pandemia. As instituições educacionais precisarão considerar modernizarem-se para integrar métodos de aprendizagem presencial e à distância. E a lista continua.

As consequências da pandemia também representarão uma oportunidade de aprender com uma infinidade de inovações e experimentos sociais, desde o trabalho remoto até a supervisão em grande escala. Tudo isso propiciará um entendimento de quais inovações, se adotadas de forma permanente, poderiam proporcionar uma elevação substancial do bem-estar social e econômico – e quais acabariam inibindo a melhoria da sociedade como um todo, ainda que agora sejam úteis na contenção ou limitação da propagação do vírus.

À medida que consideramos a escala das mudanças que o coronavírus provocou – e continuará provocando nas próximas semanas e meses – somos compelidos a refletir não apenas sobre a crise de saúde de enormes proporções, mas também sobre a iminente reestruturação da ordem econômica global. Como exatamente a crise irá evoluir ainda resta saber. Enquanto isso, os cinco estágios descritos neste artigo oferecem aos líderes um claro caminho rumo ao próximo normal – um normal que não se parecerá em nada ao dos anos anteriores ao coronavírus, a pandemia que mudou tudo.

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