A America’s Cup, troféu mais antigo do esporte internacional, é o prêmio mais cobiçado da vela competitiva. Quando a 36ª edição começou, no início de março, a Emirates Team New Zealand, atual campeã da prova, caiu na água com um novo tripulante: um bot de IA criado pela McKinsey. Essa combinação acabou se mostrando vencedora. Em 17 de março, os neozelandeses conseguiram defender seu título contra os desafiantes italianos – a equipe Luna Rossa Prada Pirelli – e venceram sua quarta America’s Cup.
A America’s Cup sempre teve a ver tanto com tecnologia e inovação quanto com navegação. Os desenhos das embarcações são regidos pela “Regra de Classe,”da competição, o que deixa poucas oportunidades para ajustes no desenho que possam dar vantagem a uma equipe sobre as outras.
Essas oportunidades, se bem aproveitadas, podem se traduzir em um desempenho brilhante no dia da prova.
Nosso objetivo era acelerar os testes dos desenhos da Emirates Team New Zealand.
A Regra de Classe para a prova deste ano, publicada em março de 2018, exigiu que as duas equipes concorrentes navegassem com uma embarcação de 75 pés. Não se trata de um veleiro típico. Hidrofólios fixados ao casco elevam toda a embarcação para fora d’água, permitindo que ela atinja velocidades superiores a 60 mph, ou 100 km/h. Mais importante ainda, os hidrofólios são uma parte do barco em que a Regra de Classe permite modificações no desenho, as quais oferecem enormes vantagens competitivas para as equipes que executam essas modificações corretamente.
Segundo Brian Fox, sócio sênior da McKinsey, fazer isso requer testes intensivos – e em grande quantidade. “Cada barco da America’s Cup é desenhado com um simulador computadorizado”, diz Brian, que é velejador de competições. “Qualquer equipe que tenha o melhor simulador e o utilize de forma mais eficaz obtém uma vantagem.”
Em 2019, a Emirates Team New Zealand fez parceria com a McKinsey para iniciar um projeto inovador em busca dessa vantagem. Elas logo perceberam que precisavam de um novo tipo de tripulante que pudesse pilotar milhares de barcos ao mesmo tempo. A resposta a isso foi um bot, ou robô de software, de inteligência artificial capaz de testar novos desenhos de hidrofólio pilotando-os no simulador da Emirates Team New Zealand.
O simulador havia sido fundamental para a vitória da equipe em 2017; os velejadores o tinham usado para testar novos desenhos de barcos sem precisar construí-los de fato. Porém, esse simulador exigia que vários membros da equipe o usassem simultaneamente para que funcionasse de maneira correta. Era um desafio logístico, considerando-se o cronograma de práticas, viagens e competições dos velejadores.
“Nossa meta”, explica Brian, “era acelerar os testes dos desenhos da Emirates Team New Zealand. Ao desenvolvermos um bot de IA capaz de operar o simulador por si só, não precisávamos mais gerenciar a disponibilidade limitada dos velejadores.”
O primeiro passo da equipe da McKinsey, que incluía colegas da QuantumBlack, nossa firma de analytics, foi recorrer à nuvem. Durante seis semanas, especialistas em dados, analytics e machine learning de Sydney, Melbourne e Londres migraram o simulador da Nova Zelândia e desenvolveram uma infraestrutura para rodá-lo na nuvem.
Depois, nossa equipe utilizou uma abordagem nova e inovadora chamada deep reinforcement learning para ensinar o bot de IA a se tornar um velejador profissional. A técnica permitiu ao bot aprender dinamicamente e adquirir maior precisão por meio de feedback contínuo. Nic Hohn, um dos principais líderes do projeto, explica. “Quando você começa, o agente de IA não sabe nada e aprende por tentativa e erro usando inúmeras variáveis – velocidade do vento, direção, ajustes nos 14 diferentes controles das velas e do barco – e é aprimorado constantemente”, diz Nic. “Como o bot continua experimentando, se você o treina para aprender da maneira correta, ele comprime em horas o que levaria anos para um ser humano entender.”
Esse foi o arranque crucial – a capacidade de tirar os cronogramas dos velejadores da equação e testar desenhos 24 horas por dia, 7 dias por semana, em repetição rápida.
O trabalho realizado foi altamente técnico, de acordo com o cientista-chefe da QuantumBlack, Jacomo Corbo, e exigiu ampla inovação no que diz respeito ao programa de aprendizagem do bot. “Nesse ponto do projeto, foi necessário muito raciocínio criativo para descobrir os modelos de aprendizagem corretos, a melhor maneira de treinar o bot e os limites e recompensas certos a serem implementados.”
A equipe também criou uma rede que permitia a vários bots compartilharem informações à medida que cada um aprendia a velejar. Esse foi um avanço essencial, pois permitiu que cada bot obtivesse conhecimento a partir de sua experiência coletiva. No fim, havia mil bots rodando em paralelo e aprendendo uns com os outros. “É uma aprendizagem em escala enorme e que reduz drasticamente o tempo e o custo do projeto”, diz Nic. “Esse é o poder da nuvem.”
Em duas semanas, o bot estava velejando em linha reta, contra e a favor do vento. Após dominar o básico, ele passou a realizar manobras de vela mais complexas.
A virada veio oito semanas depois, quando o bot de IA começou a superar os velejadores no simulador. Nesse ponto, o bot tornou-se a forma ideal de testar variações dos hidrofólios; ele era mais consistente e escalonável do que os velejadores e acelerou radicalmente os ciclos das iterações de desenho. “Esse foi o arranque crucial – a possibilidade de tirar os cronogramas dos velejadores da equação e testar desenhos 24 horas por dia, 7 dias por semana, em repetição rápida”, observa Helen Mayhew,sócia da McKinsey, membro da equipe de liderança da QuantumBlack na Europa e também velejadora campeã mundial.
Logo, os velejadores estavam aprendendo manobras com o bot. “Com uma curva de desenvolvimento tão acentuada, acelerar o processo de aprendizagem é extremamente valioso”, explica Oliver Fleming, sócio associado especialista, “em termos tanto de permitir que a equipe de design explore o espaço de desenho o máximo possível como de possibilitar que os velejadores maximizem o desempenho com um determinado desenho.”
Ao longo de 2019 e no início de 2020, o bot multiplicou por dez a velocidade do processo de desenho da New Zealand. O resultado da prova reitera que o reinforcement learning pode ser uma ferramenta transformadora para o desenho de processos, com aplicações potenciais em diferentes setores.
“Esta é uma das implementações mais complexas de deep reinforcement learning na nuvem pública”, diz Jacomo. “Uma maneira de pensar na dificuldade do problema: a complexidade da árvore de jogorelaciona, em linhas gerais, o tamanho do espaço que se deve percorrer, levando em conta também o conjunto de possíveis caminhos do jogo, ou a sequência de decisões, que devem ser tomadas. O go, que é um jogo de tabuleiro extremamente complexo, tem uma complexidade de árvore de jogo de 170; nosso problema de vela tem uma complexidade de árvore de jogo de quase 2.900.”
Dominar tal complexidade técnica, particularmente nesta aplicação, aumentou a empolgação que este projeto singular gerou em todos os envolvidos.
“É emocionante usar tecnologia e IA para dominar o vento e a água e atingir a maior velocidade possível”, diz Nic. “Isso não é a vela tal qual a conhecemos; está muito mais próximo de voar em uma aeronave de baixa altitude.”
Para saber mais sobre nosso trabalho com IA, visite McKinsey Analytics e QuantumBlack.
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